I. O QUE É UM JARDIM BOTÂNICO?
A dar crédito às versões bíblicas foi o jardim a obra inicial do Criador, do Deus Arquitecto que o fez já exercendo a função de vegetação protectora dos mananciais, porque do jardim do Éden:
- "saía um rio para regar o jardim e dali se dividiu e se tornava em quatro braços" (Génesis 2,10).
- "e plantou o Senhor Deus um jardim no Éden, da banda do Oriente, e pôs ali o homem que tinha formado" (Génesis 2,8).
- "e tomou o Senhor Deus o homem e o pôs no jardim do Éden para o lavrar e o guardar" (Génesis 2,15)
Ainda pela Bíblia encontramos que a sistemática é contemporânea dos atos iniciais da criação, pois, no terceiro dia, precisamente:
- "e disse Deus produza a terra a erva verde, dando semente conforme a sua espécie, e a árvore frutífera, cuja semente está nela conforme a sua espécie. E viu que era bom" (Génesis 1,12).
Devemos aqui encarar o jardim não mais como objecto da criação, porém rigorosamente dentro de um ponto de vista histórico e reconhecer que representa o jardim uma das mais antigas tentativas do ser humano de se sobrepor à ordem natural a ordem humana.
Quanto mais elaborada e evoluída e estruturada uma cultura, maior requinte empresta às realizações jardinísticas.
Os jardins egípcios, os jardins da Babilônia, os jardins árabes de Sevilha e Granada, o jardim japonês e os jardins europeus (italiano, francês e inglês) exemplificam bem o que foi afirmado acima.
As hordas bárbaras, os povos primitivos e os nômadas desconhecem em absoluto o jardim.
A conceituação do jardim não é precisada nem em dimensão (um jardim pode ter qualquer dimensão), nem em forma, nem pela natureza de sua composição própria.
Há mesmo exemplos de jardins sem plantas.
O jardim corresponde a uma porção limitada do espaço, organizada finalisticamente para a amenização, o proveito, a educação, o lazer, o encontro ou à meditação e a contemplação daqueles que o frequentam
Leitura complementar: A função dos jardins botânicos nos dias actuais
O que é um Jardim botânico?
Na actualidade, entende-se como Jardim Botânico a área protegida, constituída no seu todo ou em parte, por colecções de plantas vivas cientificamente reconhecidas, organizadas, documentadas e identificadas, com a finalidade de estudo, pesquisa e documentação do património florístico do país, acessível ao público, no todo ou em parte, servindo à educação, à cultura, ao lazer e à conservação do meio ambiente.
Leitura complementar: Jardim Botânico de Niterói
II. UM POUCO DE HISTÓRIA SOBRE O JARDIM DA ESTUFA FRIA
A Estufa Fria é um espaço verde com mais de 100 anos existente na cidade do Huambo, criada inicialmente para experimentação agrícola e reeducação dos presos no inicio do século XX.
Localizada na parte alta da cidade, sendo limitada a Norte pela avenida da granja, Casa Ecológica e Bispado, a Sul pela rua José António de Almeida, Seminário Maior Cristo Rei e Centro de Ecologia Tropical e Alterações Climáticas, a Este pelo largo das quitandeiras e a Oeste pelo largo Deolinda Rodrigues e o Parque Infantil.
O local que hoje acolhe a Estufa Fria era propriedade da Igreja Católica. Com previsões de construir no local a Missão, em troca o governo português cedeu outro espaço onde actualmente se encontra a Missão Católica do Cuando, instalando neste espaço uma Granja de Experimentação Agrícola.
A Granja de Experimentação Agrícola, foi criada por Henrique Mitchell Paiva Couceiro. Tudo começou com a sua nomeação em 1907 (1907-1909), como Governador Geral da Província de Angola, no mesmo ano, nomeou uma comissão, constituída pelo médico naturalista Pereira do Nascimento, pelo agrónomo Sacramento Monteiro e pelo tenente Ferreira do Amaral, para estudar as condições oferecidas pelas regiões planálticas de Angola (Planalto de Benguela (desde o rio Cuiva até ao forte do Huambo), Moçâmedes (Namibe) e Malanje) para a colonização europeia (Nascimento, 1966; Castelo, 2014).
Fruto dos resultados da comissão, em 1909 Paiva Couceiro, fixa a sua atenção no Huambo e, visionando as suas grandes possibilidades, determina em 1909 o estabelecimento de uma Granja Agrícola.
Em 2014, o historiador “Venceslau Casese”, informou que, a Granja Agrícola criada por Paiva Coucero é o espaço actualmente designado por “Estufa Fria (não se conhece ao certo quando passou a chamar-se assim)”. Na época servia de experimentação de plantas introduzidas para agricultura colonial, constituídas por espécies florestais (eucaliptus) e alimentares (fruteiras e hortícolas), era também um espaço de reeducação dos presos. Pode-se considerar como o embrião da Estação Experimental do Sacahala e do Instituto de Investigação Agronómica da Chianga, disse ele.
Em meados do século XX, consolidou-se como espaço verde público da cidade do Huambo, com múltiplas funções: abrigo de plantas, estético, turismo, leitura e lazer. A existência de um aquário com peixes de água doce, animais de pequeno porte, aves e insectos eram outros atrativos na época.
A Estufa Fria consiste num repositório de plantas, com possibilidades de estudar a botânica e os ecossistemas. Um património inestimável, de inegável interesse do ponto de vista histórico, cultural e científico. Um refugio natural a visitar, não só por manter a relação homem-planta mais próxima, fundamentalmente por nos proporcionar uma atmosfera única.
“É preciso conhecer, para poder usufruir e conservar”.
Com mais de 100 anos, o espaço encerra memórias vivas (biodiversidade) e não vivas (arquitetónicas) do seu passado histórico, cultural e científico que podem ser descobertas numa visita.
Situação actual da Estufa Fria
Desde o ano de 2012, que o espaço tem beneficiado de obras de requalificação (valas de drenagem, rede de esgotos de águas pluviais e domésticas, melhoria do leito do canal da fonte a lagoa e vedação).
Ainda assim, falta de informação relacionada ao espaço, a catalogação das espécies, dificuldades na realização de actividades educativas, ausência de
pessoal qualificado e de estruturas específicas, inexistência de projectos ligados ao ensino e investigação, inexistência de normas de utilização.
A captação de financiamento, formação de pessoal, regulamentação e uma boa fiscalização nas obras de requalificação, são uma das medidas a adoptar para a recuperação e valorização do espaço.
“Apesar da falta de estruturas específicas, a finalidade educativa e investigativa já estavam previstas, mais atenção e valorização precisa este espaço”.
Por isso, acreditamos que as próximas intervenções devolverão toda sua beleza e tornarão o espaço mais agradável, para ser valorizado e cumprir com a sua verdadeira missão: lazer, turismo, educação, investigação e divulgação da biodiversidade.
Todos são chamados a dar o nosso contributo, de forma a permitir que este espaço cumpra com o seu verdadeiro papel e que seja um dos meios indispensáveis no cumprimento dos compromissos assumidos por Angola diante da Convenção Sobre a Diversidade Biológica.
A diversidade vegetal ainda é abundante, representada por lianas, ervas, arbustos e arvores, como apresentado no seguinte ponto.
III. LABORATÓRIO VIVO DO JARDIM DA ESTUFA FRIA DA CIDADE DO HUAMBO
ORDENS (19) - FAMÍLIAS (31) - ESPÉCIES (48)
GIMNOSPERMAS
I. PINALES
Araucariaceae - Araucaria columnaris (Arvore de natal)
- Araucaria angustifolia (Palmeira do Brasil)
Pinaceae - Pinus sp. (Pinheiro)
Cupressaceae - Cupressus lusitanica Mill (Cedro-cipreste-português)
ANGIOSPERMAS MONOCOTILEDÓNEAS
I. ASPARAGALES
Agavaceae - Agave americana (Sisal)
Agavaceae - Agave americana (Sisal)
Hypoxidaceae - Curculigo capitulata (Capim Palmeira)
II. ZINGIBERALES
Cannaceae - Canna indica (Cana)
Musaceae - Musa sp. (Bananeira)
III. POALES
Cyperaceae - Cyperus alternifolius (Palmeira-umbela)
- Cyperus rotundus (Tiririca)
Poaceae - Pennisetum purpureum (Capim elefante)
- Saccharum officinarum (Cana-de-açúcar)
ANGIOSPERMAS EUDICOTILEDÓNEAS
I. SAPINDALES
I. SAPINDALES
Anacardiaceae - Manguifera indica (Manga)
II. APIALES
Araliaceae - Hedera helex (Hera)
Pittosporaceae - Pittosporum sp.
III. ASTERALES
Asteraceae - Chrysanthemum sp. (Crisãntemo)
IV. CARYOPHYLLALES
Cactaceae - Opuntia ficus-indica (Coroa-de-Cristo)
Nyctaginaceae - Bougainvillea glabra
Plumbaginaceae - Plumbago sp.
Polygonaceae - Homalocladium platycladum (Fita de moça)
V. BRASSICALES
Caricaceae - Carica papaya (Mamão)
VI. FAGALES
Casuarinaceae - Casuarina equisetifolia
VII. MALPIGHIALES
Euphorbiaceae - Acalypha wilkesiana
- Euphorbia milii (Coroa-de-Cristo)
- Ricinus communis
-Euphorbia cotinifolia (Leiteiro-vermelho)
VIII. FABALES
Fabaceae (Caesalpinoideae) - Bauhinia sp
(Papilionoideae) - Erythrina abyssinica Lam. ex DC.
IX. ROSALES
Rosaceae - Rosa sp.
Moraceae - Ficus elastica
- Ficus carica /auriculata
X. MALVALES
Malvaceae - Guazuma sp
- Hibiscus rosa-sinensis
- Malvaviscus arboreus mexicanus
- Ceiba pentandra
XI. LAURALES
XII. MYRTALES
Myrtaceae- Callistemon speciosus (Escova-de-Garrafa)
- Eucaliptus sp (Eucalipto)
- Eugenia uniflora (Pitanga)
- Psidium guajava (goiaba)
XIII. COMMELINALES
Commelinaceae - Trasdescantia zebrina
XIV. LAMIALES
Bignoniaceae - Jacaranda mimosifolia (Jacaranda)
- Spathodea campanulata (Tulipeira)
Verbenaceae - Lantana camara
XV. GENTIANALES
Apocynaceae - Thevetia peruviana
Rubiaceae - Ixora chinensis (Alfinete Grande)
XVI. SOLANALES
Convolvulaceae - Ipomoea cairica
- Ipomea purpurea
Pesquisas continuam…além da historia do espaço, espécies vegetais, animais, fungos e outros seres vivos, por descobrir...
IV. ENSINO E INVESTIGAÇÃO NA ESTUFA
Como qualquer ópera, ou teatro, um jardim perde a sua razão de ser se não tiver utilizadores.
Actividades educativas na Estufa Fria do Huambo, teve inicio em 2012, e têm sido realizadas com estudantes do 1º ano do curso de Ensino de Biologia do ISCED-Huambo.
O objectivo é consolidar e/ou complementar as temáticas apreendidas em sala de aula, com aplicação do conhecimento em contexto real, no jardim, ou mesmo concretizando aí a primeira abordagem e o entendimento de novos conceitos (Tavares, 2015).
Os conteúdos tratados neste espaço estão relacionados com a sistemática de Lineu, morfologia vegetal, biodiversidade e a educação ambiental. Temas como, diversidade de seres vivos, classificação dos vegetais, a flora Angolana, organografia vegetal e ecossistemas, leccionados no I e II Ciclo do Ensino Secundário, também podem ser abordados no local.
Encontra-se publicado um artigo na Revista Eletrónica do ISCED-Huambo (http://revista.isced-hbo.ed.ao/index.php/rop), com o tema: “Estufa-Fria: Um espaço não formal em potencial para a aprendizagem da botânica”.
V. AVALIAÇÃO
A avaliação das actividades desenvolvidas neste espaço não foge a regra, pode ser feita da seguinte maneira:
- Antes da realização das actividades educativas, é importante efectuar uma visita ao local e análise prévia dos programas escolar (Avaliação Diagnóstica);
- Pela observação no decorrer da acção é possível acompanhar as reacções, as motivações, as atitudes e os interesses dos participantes (Avaliação Formativa);
- No final realiza-se a análise dos resultados, normalmente de carácter quantitativo, recorrendo a um questionário de satisfação e de conhecimento (Avaliação Sumativa). (Tavares, 2015)
Biblioteca do Seminário Maior Cristo Rei do Huambo. Arquivo de fotografias. 2014.
Castelo, C. Colonização do Planalto de Angola. Disponível em: https://atagraria.files.wordpress.com/2012/06/colonizao_planalto_angola.pdf Acesso: 30 de Dezembro de 2015
Nascimento, A. F. (1966). Terras de Angola: Nova Lisboa. Palestra da série “DEFESA NACIONAL”.
Paiva, J. A importância da biodiversidade Disponível em: http://www.esfmp.pt/sites/esfmp.pt/files/story/1813/paiva_news.pdf Acesso: 25 de Novembro de 2015
Tavares, A. C. P. (2015). Educação em jardins botânicos - 16 anos de experiência. 1ª Edição. Coimbra-Portugal.
Venceslau, C. (Comunicação pessoal, 2014). Origem da Estufa Fria.
Sem comentários:
Enviar um comentário